terça-feira, 27 de agosto de 2019

O APARTAMENTO DE NARA

(Foto de Arnaldo Agria Huss)

Se forem entrevistados 10 fãs de Bossa Nova e a eles for perguntado onde o gênero nasceu, 9 deles certamente responderão: no apartamento de Nara. Mas se a mesma pergunta for feita a Carlinhos Lyra ele logo responderá: "isso é conversa! Nem a Nara nasceu lá!"

O famoso endereço fica na Av. Atlântica, 2853, Ed. Louvre, apto. 303, onde Nara Leão residia com seus pais e a irmã Danuza. Ainda adolescente conheceu alguns colegas que curtiam um som e estavam em busca de uma batida diferente, mais alegre e leve do que os tristes samba-canções estilo "ninguém me ama, ninguém me quer" que tocavam no rádio. Foi assim que primeiro veio Roberto Menescal, Carlinhos Lyra e o lobo bobo Ronaldo Bôscoli. E depois só foi aumentando o número de "feras" que frequentavam o apartamento até o nascer do sol.


Naturalmente isso não iria durar para sempre. Uns foram se profissionalizando e a coisa tomou uma proporção que acabou rachando a Bossa Nova em direita e esquerda. Nara preferiu sair do castelo e subir o morro, estreando no espetáculo Opinião que a consagrou. Outros partiram pelo Galeão para NY e por lá ficaram ou voltaram em busca de uma carreira solo.


Mesmo que hajam outros lugares onde os primogênitos se reuniram e onde foram gestadas canções memoráveis, nenhum lugar concentrou tanta gente que fez história na música brasileira por metro quadrado. E é por isso que eu fico com a versão-lenda do famoso apartamento e com o legado do amor, do sorriso e da flor.

BECO DAS GARRAFAS


É impossível ler sobre Bossa Nova e não encontrar n citações sobre o Beco das Garrafas, uma pequena travessa sem saída onde germinaram notas fundamentais que deram o tom da música popular brasileira que ouvimos hoje.

Tantas histórias e causos estão reunidos no compêndio de Ruy Castro e na quase biografia de Nelson Motta, e chegam a parecer lendas. O que antes era feito por um sonho ou por sobrevivência deixou poucos registros indeléveis de uma arte genuína e com talentos inegáveis, num jeito de fazer e de viver de música muito primários se comparados aos que atualmente chegam ao mainstream de forma altamente financiada e sem qualidade.


Após ler tantos relatos não resisti e fui lá pisar naquele chão onde passaram muitos do que respeito, artisticamente falando. Desci na estação Cardeal Arcoverde, segui até o sinal, atravessei a rua e segui à esquerda mais duas ruas até entrar na Duvivier. À medida que ia avançando e avistando o mar fiquei pensando em como um lugar assim efervescente na madrugada, com muitos drinks e "garrafadas" sobreviveu em meio a prédios residenciais? Ainda incrédula perguntei a um vendedor de quinquilarias na rua: onde fica o Beco das Garrafas? Ele bem carioca respondeu: "Só mais uma esquina...onde tudo começou!". Atravessei a N.Sra. de Copacabana e finalmente cheguei lá. Para minha surpresa, a livraria Bossa Nova que ficava logo na esquina fechou. Segui adiante e lá estavam eles com seus letreiros imutáveis: o Little Club e o Bottle's Bar, renascidos após a iniciativa da Heineken em 2014. Vi alguns cartazes com as próximas programações: Quarteto do Rio (ex Os Cariocas) e Doris Monteiro. Tudo muito simples, quase artesanal, sem muito glamour nem apelo estético, condizente com o nível dos que frequentam o local por turismo ou por amor à arte.


Para completar o circuito, ao chegar em frente ao calcadão e virar à direita para retornar ao metrô, mais alguns passos e quem estava lá? Ele! O clássico símbolo de resistência dos anos dourados: o Copacabana Palace. Suspiros à parte, voltei para o hotel com a sensação de missão cumprida e certa de que ainda terei muito mais a explorar.






quarta-feira, 21 de agosto de 2019

RUA NASCIMENTO SILVA, 107


Após ler a biografia do Tom e o compêndio de Ruy Castro fiquei pensando: como foi
que eu morei no Rio tantos anos e não visitei certos lugares? Precisei sair de lá para conhecer tudo que deixei para trás por falta de acesso a fatos e causos da nossa música popular brasileira.

Lembro que a primeira vez que tive essa sensação de "Caramba! Quanta história tem nesse lugar!" foi quando avistei o Copacabana Palace. Aquela edificação imponente, clássica e símbolo de um Rio que não existe mais. Além dele, os livros relatam sempre as famosas boates da Zona Sul que também já se foram, onde muitos nomes hoje famosos tocavam madrugada a dentro para pagar o aluguel. E esmiuçando mais um pouco, tem o bar preferido, a mesa onde foi composta essa ou aquela canção...

No caso do Tom, há vários endereços entre o vai e vem do início do casamento com Thereza, mas sem dúvida alguma o mais lembrado é o da Rua Nascimento Silva, 107, Ipanema, Rio de Janeiro-RJ. Assim sua irmã Helena relata em Antonio Carlos Jobim, um homem iluminado:

"Mais uma vez, o perplexo Ângelo Fróla foi convocado com seu caminhão de mudanças. Rua Nascimento Silva, 107. Endereço que mais tarde seria famoso, cantado no samba de Toquinho e Vinicius, Carta a Tom. Um pequeno apartamento de duas salas e dois quartos, num prédio sem elevador. De suas janelas se via o morro do Corcovado, com a bela estátua do Cristo Redentor. Ainda não haviam construído à sua frente as grandes muralhas de concreto dos edifícios. Sentado ao piano, Tom gostava de ver o momento em que Ele se iluminava na hora do ângelus, os braços abertos abençoando a cidade do Rio de Janeiro."


Lá foram compostas com Newton Mendonça Meditação, Desafinado, Samba de uma nota só, entre outras, para não falar dos álbuns Canção do Amor Demais (Elizeth Cardoso), Chega de Saudade (João Gilberto) e as da peça Orfeu da Conceição (Vinícius de Moraes). Os registros feitos por Helena levam a concluir que o casal residiu lá de 1954 a 1962 (embora na placa conste 1960), quando sua mãe propôs uma troca de casa por causa do espaço maior para as crianças na Rua Barão da Torre, paralela à Nascimento Silva. De lá só saíram para a famosa casa navio da Rua Codajás, 108, Leblon, mas isso já é tema para outro post.








sexta-feira, 2 de agosto de 2019

GAROTA DE IPANEMA


Há mais de 50 anos, em 02 de agosto de 1962, o trio que mudou e lançou a música brasileira no mundo estreavam na boate Au Bon Gourmet no Rio, dando um certo prejuízo ao dono do espaço, o empresário Flávio Ramos, mas deixando um legado de canções inesquecíveis com a participação especial de Os Cariocas. Entre elas, está a história de uma certa garota que conquistaria para sempre o coração dos músicos e se tornaria nossa canção símbolo. Para sua estréia,  Tom, Vinicius, e João escreveram uma introdução especial. 

João Gilberto:

Tom e se você fizesse agora uma canção
Que possa nos dizer
Contar o que é o amor?
Tom Jobim:
Olha Joãozinho
Eu não saberia
Sem Vinicius pra fazer a poesia
Vinicius de Moraes:
Para essa canção
Se realizar
Quem dera o João
Para cantaaaaaaaaaaaaaar
João:
Ah, mas quem sou eu?
Eu sou mais vocês.
Melhor se nós cantássemos os três.
Os três:
Olha que coisa mais linda
mais cheia de graça
 […]

Historicamente, foi primeiro "grande encontro" da música brasileira, permanecendo 40 noites em cartaz, estando todos juntos pela primeira e pela última vez. Além de Garota de Ipanema, herdamos também os bônus que podem ser conferidos AQUI :
#1 a estréia de Samba do Avião, com Tom Jobim e Os Cariocas
#2 a estréia de Samba da Benção, com Vinícius
#3 a estréia de O Astronauta, com Vinícius (Tom faz o piano, Os Cariocas os vocais)
#4 Corcovado, com João Gilberto e Os Cariocas