quinta-feira, 31 de maio de 2018

ESTAR SÓ É PARA OS FORTES


Tem gente que se pela de medo da solidão, de estar a sós consigo mesmo, de ouvir o eco da voz em um apartamento. Estar só é bom, é saudável e ajuda tanto a gente a se conhecer. Por isso, me recolho algumas vezes pra organizar as ideias, fazer novos planos e sonhar outros sonhos.





RIO À MESA: DEGUSTARIA TUDO OUTRA VEZ!

"Até parece que foi ontem minha mocidade
Com diploma de sofrer de outra Universidade
Minha fala nordestina, quero esquecer o francês
E vou viver as coisas novas, que também são boas
O amor/humor das praças cheias de pessoas
Agora eu quero tudo, tudo outra vez" (Belchior)
A gente nem sempre se dá conta de quanta memória acumula nas andanças e vivências da vida. Às vezes, basta uma canção ou um gesto pra despertar uma lembrança simples, cotidiana, pequenos prazeres em meio à toda estranheza que o Rio me causou por tantos anos. Quando me acostumei, aproveitei cada minuto, mas aí já era hora de voltar.

Vou me ater aqui a gastronomia popular e aos lanches que viraram hábitos até hoje, ou sempre que consigo reproduzir, além de algumas iguarias que os cariocas amam e que eu provei ou aprendi a amar. Ficam aqui como sugestão para quem quiser se aventurar nessas guloseimas que a cidade maravilhosa também tem!

1-PODRÃO: demorei muito a encarar o cachorro-quente de linguiça e hoje só lamento o tempo que perdi, ainda mais pela combinação única de muitas tranqueiras adicionadas como queijo parmesão de saquinho e batata palha, além da inigualável combinação de molho verde e uva passa. Cheguei a pedir a receita a uma vendedora alegando que estaria longe e que não haveria concorrência, mas ela negou até o fim.

2-EMPADA: na lenha, no forno, na casa da empada, não importa o meio: o carioca é o rei da empada de qualquer sabor. E o empadão então, não tem pra ninguém!

3-BISCOITO PIRAQUÊ: morei no bairro da fábrica e sentia o cheiro de massa assando no final da tarde. Até tentei apresentar outras marcas aos colegas, mas para eles é preferência estadual. Cara que só, mas eles não abrem mão.

4-BISCOITO GLOBO: acho que uma vez provei essa espécie de biscoito de vento quebradiço. É algo como o "passatempo da sua viagem", como comer pipoca no ponto de ônibus.

5-CALDOS E SOPAS: as três clássicas são sopa de ervilha, sopa de entulho e caldo verde. Custei a encarar e não via grandes coisas, mas não faria uma desfeita dessas e logo as incluí na minha rotina de comida de quermesse. Inclusive foi assim que fui provando legumes e verduras que eles amam (espinafre, brócolis, couve, couve-flor, etc), além de bife e batata frita. Aliás, o feijão preto também entra nessa lista, porque ou eu comia ou morria de anemia.

6-CHURROS: ir ao Saara comprar qualquer coisa que só se acha lá, ou ir em algum museu ou olhar as barcas saindo pra Niterói e na volta não comer um churros? Im-pos-sí-vel!

7-BOLINHO DE AIPIM/CALDO DE CANA COM PASTEL: hábito maravilhoso após as compras em Madureira. Às vezes, quando a manutenção do aparelho permitia e sobrava um troco, era meu mimo diante da imensa saudade de casa.

8-COMIDA MINEIRA: acho que devido à proximidade, a influência mineira é muito forte. No mínimo, uma vez por semana, almoçava um tutu, couve, carré suíno, arroz e farofa no quiosque do Fundão.

9-PÃO DE QUEIJO: é comida mineira, mas é patrimônio nacional. No café da manhã com suco de laranja ou no final da tarde no Centro ou no Rei do Matte com chocolate quente: uma delícia!

10-LANCHES DO FUNDÃO: croissant de chocolate do "baratinha", esfirra, maçaruco ou joelho do "sujinho", alguma bóia do "Dom Ratão" ou as tortas de aniversário da "tia do bloco G".




quarta-feira, 16 de maio de 2018

DECLARAÇÃO DE AMOR


Esta é uma confissão de amor: amo a língua portuguesa. Ela não é fácil. Não é maleável. […] A língua portuguesa é um verdadeiro desafio para quem escreve. Sobretudo para quem escreve tirando das coisas e das pessoas a primeira capa de superficialismo.
Às vezes ela reage diante de um pensamento mais c omplicado. As vezes se assusta com o imprevisível de uma frase. Eu gosto de manejá-la – Como gostava de estar montada num cavalo e guiá-lo pelas rédeas, às vezes a galope. Eu queria que a língua portuguesa chegasse ao máximo em minhas mãos. E este desejo todos os que escrevem têm. Um Camões e outros iguais não bastaram para nos dar para sempre uma herança de língua já feita. Todos nós que escrevemos estamos fazendo do túmulo do pensamento alguma coisa que lhe dê vida.
Essas dificuldades, nós as temos. Mas não fale do encantamento de lidar com uma língua que não foi aprofundada. O que recebi de herança não me chega.
Se eu fosse muda e também não pudesse escrever, e me perguntassem a que língua eu queria pertencer, eu diria. inglês, que é preciso e belo. Mas, como não nasci muda e pude escrever, tornou-se absolutamente claro para mim que eu queria mesmo era escrever em português. Eu até queria não ter aprendido outras línguas: só para que a minha abordagem do português fosse virgem e límpida.
LISPECTOR, C. A descoberta do mundo Rio de Janeiro Rocco, 1999 (adaptado).