sábado, 14 de julho de 2012

DEIXA CHOVER

Enquanto os galos da vizinha erram o horário de cantar e me despertam na hora em que me recolho, aproveito o inverno, essa estação deliciosa de hibernações a qualquer hora, sopas e leite caramelado para descansar meu coração e limpá-lo das desventuras e aborrecimentos inevitáveis que às vezes me assaltam.

Arrumei os livros na estante e continuo com a mania de ler mais de um ao mesmo tempo sobre os mais variados temas, sendo os mais recorrentes ciência e espiritualidade. Joguei muita coisa fora, coloquei muita coisa no lugar, achei coisas que nem lembrava mais que eu tinha e, para não balançar demais o coração na faxina de fim de verão (considerando que em Paulo Afonso o inverno só acena uns chuviscos e o termômetro só despenca à noite), a realizei por etapas. Entre um espirro e outro recusei ou atendi telefonemas, criei a lista de leitura e de AV (a ver) dos livros e filmes no nicho da espera. Limpei as gavetas, que ficaram bem mais leves, e não só contribui com os catadores de papel, como também segui a linha da leitura sustentável doando as palavras que já me fizeram bem, ou roupas que podem vestir os que precisam. No meio desse desacato à ordem, um dos ganhos das leituras foi a Revista Vida Simples, onde achei um artigo que falava o seguinte:

"Passamos a maioria do tempo nos esforçando para correr ao lado do rio da vida, segurando complexas análises de suas águas. Ora, qual o melhor modo de igualar nossa velocidade à do rio? Pular.

Para desembaraçar um fio, você pode puxá-lo e remover nó a nó. Ou pode afrouxar, balançar, deixá-lo cair e se surpreender quando perceber que ele não estava emaranhado de fato. Nossos ancestrais taoístas já ensinavam a não-ação: faça menos para que as coisas possam se fazer. 
Melhor que fazer nossa ondinha numa piscina de plástico, nossa revolução pessoal talvez seja esperar por grandes ondas. Dar um passo e deixar o céu se mover. Travar diálogo com o que nos rodeia." (Gustavo Gitti)
Lembrei da cadeira de balanço de minha avó Marina, que ía e vinha à tarde com ela a cumprimentar quem passava e a nos vigiar nas brincadeiras das férias. Quando ela saía da cadeira eu sempre dava um jeito de sultilmente tomar posse antes que um dos meus primos a vissem vazia, e como era mágico os instantes que ali passava com a brisa a beijar o rosto. Hoje, com a correria do mundo fast, as pessoas pagam psicólogos para tratarem suas agruras, pacotes de viagem para relaxar em praias e se preenchem de todo jeito quando deveriam se esvaziar. Diz o Evangelho (apócrifo) de Tomaso:
"Se você expressar o que está dentro de você
o que você expressar irá salvá-lo.
Se você não expressar o que está dentro de você
o que você não expressar irá destruí-lo"
Por enquanto, enquanto em vários lugares do mundo as pessoas aproveitam o verão, aqui estou aproveitando ao máximo o inverno e essa calmaria para refletir, acalmar as tsunamis. Quando vem a chuva e a vejo caindo, deixo que ela leve e lave também o que não quero mais dentro de mim, e do jeito que adoro essas manifestações da natureza, quanto mais rajadas de vento melhor. Gosto ainda de sentir o calor do sol que tira a umidade no meio da tarde, do céu límpido repentino (olha lá! o sol abriu!) e das nuvens lilazes ou roxas (painho, como é que a gente sabe que vai chover?). E assim sei que essa estação assim sentida dará muitos frutos, a seu tempo, na primavera ou no outono, e quiçá no próximo inverno, pois como diz a melodia de João Bosco: "até que tudo revolva por si novas canções vão surgir". 
  

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