“Eu não sou uma profissional, eu só escrevo quando eu quero. Eu sou uma amadora e faço questão de continuar sendo amadora. Escrevo porque encontro nisso um prazer que não consigo traduzir. Não sou pretensiosa. Escrevo para mim…” (Clarice Lispector)
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segunda-feira, 28 de abril de 2014
O SONHO DE WADJDA
As férias sempre rendem uns achados e a pérola da vez é O Sonho de Wadjda, um filme que retrata a vida de uma menina cujo sonho é ter uma bicicleta. O que há de mais nisso? Nada para nós ocidentais, mas para ela era uma grande meta. No seu país meninas simplesmente não podem andar de bicicleta, são dadas em casamento muito cedo e tem que cobrir o rosto em público para que os homens não o vejam. Wadjad permaneceu o quanto pôde imune a tudo isso e usava All Star, ouvia rock, jogava videogame e fazia pequenos favores e artesanato para juntar os 800 riales necessários para adquirir a tão sonhada bicicleta.
É lógico que seu modo de ser incomodava, principalmente à diretora que a repreendia com frequência. Mas como em casa ela encontrava um ambiente acolhedor, apesar dos conflitos culturais entre seus pais, nada a deteve e é dessa forma que ela cativa o espectador com sua determinação e perseverança.
segunda-feira, 21 de abril de 2014
OÁSIS DE JORLANE #4: DORMIR
"E eu tinha resolvido que ia dormir para poder sonhar, estava com saudade das novidades do sonho." (Clarice Lispector em Água Viva)
Quando veio a escola, minha tias muitas vezes me vestiam ainda na cama e estudar cedo era só pelo dever, porque eu nunca fui da manhã! Meu metabolismo é de meio-dia em diante! Estudar e trabalhar cedo sempre foram obrigações irrevogáveis da vida, ofícios incontestáveis os quais até hoje só cumpro por motivo de força maior! Sinto que a cada fase da vida esse necessidade ferrenha de sono vai se modelando ao tempo disponível. Se quando criança eu achava o maior tédio cochilar à tarde, hoje eu programo cada minuto a mais possível, como quando eu passava pelos fins de período na faculdade e acordava já pensando na hora de voltar pra casa e dormir.
Minha mãe e meu pai até hoje costumam dizer: minha filha, quem muito dorme, pouco vive! Mas eu sou daquelas pessoas que precisam sempre de um cochilo e de uma boa noite e manhã de sono para viver bem e de bom humor, para tomar decisões e para colocar a cabeça em ordem! Para acordar preciso de dois despertadores e os programo de modo a ter uns 15 minutinhos de sono a mais. Como o tempo e as preocupações da vida adulta, aprendi que antes de dormir não devo nem posso ler email de trabalho ou coisa que vá me preocupar, senão a depender do dia e do stress o sono já era. Não durmo em qualquer lugar e preciso de silêncio, escuro e todo um ritual para começar a dormir. Sem o escuro realmente não libero melatonina, o hormônio do sono, e adeus sono perfeito. Passe o tempo que for, de segunda a sexta ainda sonho com o sábado e a não obrigação de acordar cedo. Ah! E sempre que posso faço a sesta. E como estou de férias, bye bye e bons sonhos para vocês também!
quinta-feira, 17 de abril de 2014
LAPIDAR, MUDAR, CRESCER!
"A pessoa que não sofre é motivo de estudo. Nós todos temos motivos de sofrimentos, a finitude da vida, envelhecemos, morremos, temos desconfortos físicos e morais. Tudo isso é sofrimento. Tenho muito medo de livro de auto-ajuda porque ele quer desviar você daquilo que é importantíssimo. Você tem que encarar. Você tem que dizer sim para aquela dor. Fugir de dor é uma perda de tempo, você encontra ela em cada esquina." (Adélia Prado no Programa Roda Viva)
quarta-feira, 16 de abril de 2014
O JEITO LEBLON DE SER
Recentemente assisti a uma reportagem sobre a influência das novelas brasileiras em Moçambique. Já se criou até o termo "brazilian way of life" pra definir o impacto que a enxurrada de programas de TV tem causado nas comunidades fãs das novelas e da versão fantasiosa que é transmitida do nosso país. Na reportagem destacaram-se as novelas gravadas no Leblon, e qualquer pessoa que passe apenas uma vez em frente a TV por semana, mesmo durante os comerciais, sabe que as novelas de Manoel Carlos e suas Helenas são mais fantasiosas do que qualquer enredo de Maria do Bairro. Essas novelas tem encantado e influenciado as jovens e mulheres moçambicanas com os romances de gente branca, fina e de bem com a vida, e eu torço para que elas logo percebam que nas novelas de Manoel Carlos, como em outras do gênero global:
# as pessoas não pegam nem passam horas no ônibus nem no metrô, mas andam de taxi com tarifa zero não importa a distância;
# as mulheres dormem e acordam maquiadas e penteadas;
# essas mesmas mulheres, mesmo tendo um emprego de classe média, moram em apartamentos com quartos maiores que a suíte master do Copacabana Palace;
# os quartos são quase do tamanho do apartamento inteiro e tão grandes que daria para fazer cooper só em torno da cama e hidroginástica na banheira;
# quando os personagens não moram em apartamentos é porque moram em mansões e passam o dia tomando café na cama ou no analista ou na piscina;
# as empregadas domésticas, babás, motoristas e porteiros são quase sempre negros e/ou pobres;
# as pessoas trabalham só meio expediente e o restante do dia passam na praia limpa e bem frequentada;
# uma mulher é disputada por dois homens ou um homem é disputado por duas mulheres e apenas um é escolhido no final;
# traição e troca de parceiro, inclusive por outro do mesmo sexo, é coisa bem comum e as pessoas são modernas para aceitarem isso numa boa, sem conflitos;
# os filhos são mimados e eternamente dependentes dos pais, já que nascem herdeiros e levam a vida numa boa;
# os filhos estudam e vão à faculdade só pra cumprir tabela;
# as pessoas frequentam restaurantes e lanchonetes sem moderação nem contas a pagar;
# quando doentes, os brancos frequentam bons hospitais e os empregados, com muita sorte e gratidão de seus patrões, conseguem uma consulta particular;
# os patrões ou os filhos dos patrões, vira e mexe, dão em cima e dormem com as empregadas;
# raramente um negro se casa com uma mulher branca, e vice-versa;
# os negros geralmente atuam como bandidos e ladrões, ou como aquela parcela-exceção da sociedade que se deu bem sabe-se lá por quê;
# quando os brancos querem fazer uma ação social adotando uma criança negra, dão uma ajuda para a ceia de natal do empregado ou sobem o morro para curtir o baile funk e comprar droga na comunidade;
# quando as empregadas vão à praia é acompanhando suas patroas ou em sua rara folga semanal, e mesmo de folga elas terão que usar o elevador de serviço;
Por fim, desejo que as jovens e mulheres moçambicanas não alisem seus cabelos nem troquem a capulana pela calça jeans, e entendam que no mundo do faz de conta global os negros sempre serão maioria somente nas novelas sobre escravidão.
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