domingo, 29 de dezembro de 2019

MAIS UMA HISTÓRIA DE UM CASAMENTO


Após muita expectativa vs realidade, concluo que muitos trailers criam uma ideia de que um filme maravilhoso está pra ser lançado e que você só vai sossegar quando assisti-lo. Foi assim a minha experiência com História de um Casamento, o qual me fez recordar bem de longe da obra-prima Kramer vs Kramer.

Muitos críticos apontam que a trama está centrada na guarda do filho Henry, negociada por Nicole e Charlie. A criança parece alheia a tudo e ao longo do filme fica claro que não há volta e não há por quem torcer, que só nos resta esperar como esse imbróglio será finalizado. De repente, o que parecia estar em ordem se parte e pra piorar uma das partes resolve voltar para a sua família na Costa Oeste, lado geograficamente oposto ao antigo lar do casal. Era pra ser algo resolvido na paz de uma conversa civilizada, mas novamente uma das partes muda o rumo da situação para algo muito custoso financeiramente e emocionalmente desgastante, inserindo o fator advogados entre eles, acabando de vez com o que parecia que iria restar após a separação que virou oficialmente divórcio.

Ao contrário de muitos comentários que exaltam o drama, não subtraí um lencinho sequer durante a sessão, não senti absolutamente nada. Apesar da boa atuação, a impressão que tive foi que a beleza dos atores maquiou a tensão existente, mas ainda assim curti a fotografia e alguns diálogos dos advogados, que dão um toque quase de comédia romântica ao filme.

"O nosso amor se transformou em bom dia..."



MENOS É MAIS!


sábado, 28 de dezembro de 2019

QUEM SOMOS E PARA QUEM SOMOS?


"Somos quem o mundo pensa quem somos e, às vezes, não somos. 
Decidimos quem somos, quando queremos e quem queremos que saiba". 
(Filme O Maior Amor do Mundo)


No filme "O maior amor do mundo" ou "Mother's Day" Julia Roberts interpreta Miranda Collins, uma celebridade que reencontra sua filha doada após uma gravidez não planejada. Num dos momentos em que ela está processando todos os sentimentos envolvidos acerca dessa novidade, seu produtor diz essa frase acima, fazendo alusão a ela sair do personagem e assumir sua condição de mãe e avó publicamente e se abrir a uma nova fase, para além dos holofotes e da fama. 

Curiosamente, enquanto buscava mais informações sobre o filme, me deparei com uma descrição de um blogueiro que achei bem interessante e de um autor que já foi campeão de citações no Facebook:

"Não sou para todos. Gosto muito do meu mundinho. Ele é cheio de surpresas, palavras soltas e cores misturadas. Às vezes tem um céu azul, outras tempestade. Lá dentro cabem sonhos de todos os tamanhos. Mas não cabe muita gente. Todas as pessoas que estão dentro dele não estão por acaso. São necessárias!" (Caio Fernando Abreu)

As duas citações caminham em pistas opostas, pois enquanto a primeira me fez pensar em toda exposição gratuita da vida nas redes sociais, muitas vezes no estilo "me note!", a segunda me lembra a privacidade tão preciosa, o nosso infinito particular que deve ser seletivo a fim de estabelecer um limite entre quem entra e para quem a gente só acena da janela.

"Somos quem o mundo pensa quem somos...", mesmo que tentemos em vão provar que somos melhores, mais nobres e mais fortes. Podemos passar a vida inteira tentando provar quem somos e de nada irá adiantar, pois o outro vê o que que ver a nosso respeito. 

"Decidimos quem somos, quando queremos e quem queremos que saiba"...acho que sem perceber, ou querendo mesmo, os atores das redes sociais fazem a festa no filtros e efeitos, maquiando a realidade para ela ser mais palatável em alguns momentos. A gente "segue" aquela vida, aquela rotina, mas não percebe que tudo aquilo não diz quase nada sobre a pessoa, ou até diz e diz até demais. Os signos são exaltados a todo instante, e um unfollow ou um like servem de mote para uma tese inteira, para deduções fantasiosas e catalisadoras de futuras inimizades.

Eu não sigo nem tenho nenhuma dessas redes, só possuo este humilde blog, mas não importa: a curiosidade e a partilha da vida alheia chega aos meus ouvidos em prints e áudios. Quantas deduções, quantas revelações inúteis e quanta energia gasta em se ocupar do outro enquanto a própria vida anda meio capenga. Porque o importante não é mais experimentar, viver, sentir, mas compartilhar o sorvete, o corte de cabelo, o novo perfume, o look, etc.

"Não sou para todos. Gosto muito do meu mundinho..." A falsa ideia de bloquear, manipular ferramentas de "ele me segue, mas não vê tudo" é inútil. Não ser para todos custa uma exclusividade a ser exercitada, e isso desperta mais curiosidade ainda. Não ser para todos é manter-se à margem, por fora, longe dos buchichos, das tretas, alheia, e é assim que ainda gosto de ser, porque gosto muito do meu mundo maravilhoso, onde até cabe muita gente, mas só permanecem as que realmente são necessárias!


quarta-feira, 25 de dezembro de 2019

CHEGOU O NATAL!


"Let us all remember

In our gift giving and our merriment
With our family and friends and loved ones
The real and true meaning of Christmas
The birth of our Lord and Savior, Jesus Christ"
(O Tannenbaum - Ernst Anschütz)

segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

SOBRE VIAGENS


"Gosto muito de viajar. Na hora que o avião levanta, é como se cortasse o fio do dia-a-dia, dos problemas, das contas a pagar, do cara chato que te procura...De todas essas coisas. Então minhas viagens são como férias. Mas não falo turismo nenhum, não!...Eu adoro hotel, quarto de hotel - ou então um lugar onde eu possa andar. Não vou conhecer os lugares turísticos. Gosto de ir a lugares simpáticos, onde eu possa ter paz." (Roberto Menescal)

sexta-feira, 22 de novembro de 2019

NUNCA PROVEI, MAS AINDA QUERO PROVAR


1- Qualquer coisa temperada com tomilho, o tempero queridinho de todos os canais de culinária que respeito!

2- Lagosta: tem que saber como destrinchar para depois degustar!

3-Vieiras: preciso, sonho e quero muito provar essa iguaria.

4-Molho pesto original, como os pinoli da vida.

5- Queijos, queijos e mais queijos franceses...

6- Alguma receita bem feita com alcachofra.

7- Alguma receita bem feita com aspargos.

8- Menu degustação de gastronomia molecular.

9- King Crab: esse sim eu respeito!

10-Tiramisu original para fechar como sobremesa.


quinta-feira, 31 de outubro de 2019

VERSÕES QUE AMO #5: THE PLATTERS

Dia desses estava na minha TV Tube e pintou sugestão do Programa Todo Seu. Pauta musical do dia: The Platters. Olha aí o pessoal de Smoked in your eyes que eu copiei da Georgia! Ronnie Von estava todo emocionado de recebê-los e eu parti logo pra busca para saber como eles existem/resistem na cena até hoje. Nessa busca achei uma versão para Chove Lá Fora de Tito Madi, um dos precursores da Bossa Nova quando ela ainda nem tinha esse nome.

A canção está registrada em Les Platters Autour du Monde, álbum de 1958, apenas um ano após ter sido lançada no Brasil. Quem assina a versão é ninguém menos que Buck Ram, autor de Only You.


Inside, outside
Inside, outside
Oh, darling let me in
It's raining outside
Please let forgive me soren
It's raining outside
Oh, let my arms return
To hold you near me
Your darling heart must learn
I love you dearly
Oh, darling please be kind
Don't leave me outside
Outside your heart am I
Oh, take me inside
The rings in my heart
And my heart cries
Our love dies
Our love dies
It's inside raining outside
Inside, outside
Inside, outside
The rings in my heart
And my heart cries
Our love dies
Our love dies
It's inside raining outside inside
Inside, outside

VERSÕES QUE AMO #3: EL DEBARGE

Conheci El Debarge através de musicões de FM (All this love), e mais tarde flanando pela web com a interpretação de Dindi nos vários compilados de "Bossa Brazil" que existem no YouTube. Dindi, que não foi nenhuma musa e sim uma fazenda próxima a Petrópolis chamada Dirindi, de onde se extraiu o diminutivo e a inspiração pela vasta paisagem com morros e riachos num vilarejo que a família Tom Jobim tinha propriedade, é um dos clássicos que o mestre fez em parceria com Aloysio de Oliveira.

Muitos já gravaram Dindi em português e alguns se arriscaram em inglês. Durante esta pesquisa descobri que essa versão tocou na novela global Por Amor, e agora imagino os cenários leblonianos que fizeram parte do combo cidade maravilhosa para exportação. Confira o áudio à la passeio na Zona Sul do Rio e a versão do letrista Ray Gilbert:

DINDI

Sky, so vast is the sky
with far away clouds just wandering by
Where do they go?
Oh I don't know, don't know
Wind that speaks to the leaves
Telling stories that no one believes
Stories of love belong to you and to me

Oh, Dindi
If I only had words I would say
All the beautiful things that I see
When you're with me
Oh my Dindi
Oh Dindi
Like the song of the wind in the trees
That's how my heart is singing Dindi
That would be me without you, my Dindi
Oh, my Dindi

Oh, Dindi
If I only had words I would say
All the beautiful things that I see
When you're with me
Oh my Dindi

Don't you know, don't you know
Don't you know, Dindi
I'd be running and searching for you
Like a river that can't find the sea
That would be me without you, my Dindi
Oh, my Dindi
That would be me, Dindi

Where would I be, Dindi?
Where would I be, Dindi?
Oh, Dindi (that would be me, Dindi)
I'd flowing like a river can't find the sea
That would be me, baby
Without you, without you, Dindi
I want you to know I love you so, baby
I love you






VERSÕES QUE AMO #4: OLIVIA ONG


Por que demorei tanto para ouvir Olivia Ong? Por que não dei ouvidos à dica de Ianni? A voz dessa intérprete casa perfeitamente com a Bossa Nova, fazendo as honras dos japoneses que são apaixonados pelo gênero até mais que os brasileiros. Apesar de ser natural de Singapura, ela é contratada de uma gravador japonesa e canta em inglês e japonês.

Seus trabalhos com Bossa Nova são A Girl Meets Bossa Nova vol.1 e 2, onde ela interpreta de Justin Bieber a Frank Sinatra. A minha preferida é a versão de Samba de uma Nota Só ou One Note Samba do mestre Tom Jobim em parceria com Newton Mendonça.

ONE NOTE SAMBA

This is just a little samba,
Built upon a single note
Other notes are bound to follow,
But the root is still that note
Now this new one is the consequence,
Of the one we've just been through
As I'm bound to be the unavoidable consequence of you
There's so many people who can talk
and talk and talk and just say nothing,
Or nearly nothing
I have used up all the scale I know,
And at the end I've come to nothing,
Or nearly no- thing
So I came back to my first note,
As I must come back to you
I will pour into that one note,
All the love I feel for you
Anyone who wants the whole show, Re mi fa sol la si do
He will find himself with no show,
Better play the note you know

segunda-feira, 21 de outubro de 2019

VERSÕES QUE AMO #2: SARAH VAUGHAN

Continuando na linha dos gringos que nos amam, meu caro amigo Youtube me apresentou há us anos atrás a lindíssima versão Bridges de Travessia do Milton Nascimento, gravada por Sarah Lois Vaughan ou a "divina do jazz", que era apaixonada por música e músicos brasileiros. Em 1978 ela lançou essa versão no disco feito com músicas de Milton, Dori Caymmi, Tom Jobim e Marcos Valle, intitulado "O Som Brasileiro de Sarah Vaughan", primeiro da trilogia seguido por “Exclusivamente Brasil” (1979) e “Brazilian Romance” (1987). Segue o relato detalhado do disco e das gravações aqui, além da versão feita pelo letrista Gene Lees:


I have crossed a thousand bridges
In my search for something real
There are great suspension brigdes
Made like spider webs of steel
There are tiny wooden trestles
And there are bridges made of stone
I have always been a stranger
And i've always been alone

There's a bridge to tomor...row
There's a bridge from the past
There's a bridge made of sorrow
That i pray will not last
There's a bridge made of colors
In the sky high above
And i think that there must be
Bridges made out of love

I can see her in the distance
On the river's other shore
And her hands reach out longing
As my own have done before
And i call across to tell him
Where i believe the bridge must lie
And i'll find it, yes i'll find it
If i search until i die

When the bridge is between us
We'll have nothing to say
We will run through the sun light
And i'll meet him halfway
There's a bridge made of colors
In the sky high above
And i'm certain that somewhere
There's a bridge made of love

No artigo do El País intitulado "A travessia de Milton Nascimento" há as seguintes curiosidades sobre a obra-mãe: "o título de Travessia, canção com letra de seu amigo Fernando Brant, foi extraído do romance Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa: é a última palavra do livro. Com ela Milton Nascimento se apresentou no Festival Internacional da Canção (FIC) e se tornou conhecido no Brasil. Existem gravações de Travessia em inglês, Bridges, de Sarah Vaughan, Tony Bennett ou Björk. Também foi cantada por Elis Regina, que chegou a dizer que, se Deus tinha voz, era a de Milton." Apesar desses vários intérpretes, ainda me encanta a química do grande encontro desses dois monstros que souberam fundir suas vozes nessa linda e única versão.




VERSÕES QUE AMO #1: THE MANHATTAN TRANSFER

Eu sou uma pessoa declaradamente amante da arte "música", mas como já mencionei aqui no blog algumas vezes eu não cresci tendo acesso a discos nem vitrolas. Quando eu tinha oportunidade de pegar num disco na casa de alguma colega da escola, eu lia a ficha técnica, cada letra de música e até o que vinha escrito no meio do bolachão. Eu tratava o disco como se fosse uma relíquia, o que na verdade são para mim até hoje.

Muito tempo mais tarde com a chegada da internet foi que eu pude descobrir que muitas canções que amo são versões muito bem feitas (outras nem tanto!) por pessoas que são feras nisso, e que eu vi o nome se repetindo nos encartes. Nos discos da Xuxa e Patrícia Marques, por exemplo, só dava Michael Sullivan e Paulo Massadas. De Smoked in your eyes de Ray Conniff a Black Orchid do Steve Wonder, para público infantil ou para os melo-românticos, esses caras estavam em tudo!

Com a chegada do Youtube a minha busca só aumentou, e tenho feito novas descobertas e tenho tido gratas surpresas, pois a música é universal e as letras e ondas correm numa pista de mão dupla. Foi assim que acabei cruzando com Esquinas de Djavan numa versão intitulada "So You Say" gravada em 1987 pelo grupo vocal americano The Manhattan Transfer no álbum Brasil. A versão feita por Amanda McBroom ficou bem parecida, e o instrumental e vocal à altura, dando ênfase ao sentimento de solidão e reflexão que a obra transmite.





So you say
It's a feeling I'll get over someday
So you say
So you say
I should try
Just to let the flame inside me die
I should try
So you say
Against the wind
With my face turned to the empty side
Of loneliness
Midnight black and blue
So you say
That the world will keep on turning
So you say
So you say
Tell me why
All the stars have lost their mystery now
Tell me why
Tell me how
Where love has been
The taste of wine
Seems to linger on like distant perfume
And all of the memories
Carelessly left behind
Ghosts and lies
They haunt me wherever I go
So you say
That the pain of love will pass away
So you say
So you say
Before goodbye
I look for the fire behind your eyes
But they're cold as ice
I hear in your voice
The echo of love that's gone by
Now I cry
I'll love you for all of my life
So you say
It's a feeling I'll get over someday
So you say
So you say

Segundo Adriana Fiuza Meinberg em seu artigo "A tradução da canção popular", "à primeira vista, tem-­se a impressão de a tradução ter ignorado por completo a letra da canção original criada por Djavan, o que restringe a análise do trabalho de versão ao aspecto conteudista. Contudo, um olhar menos apressado acaba nos revelando que a versionista optou por realizar uma tradução homofônica, privilegiando a sonoridade do texto poético da língua de partida e marcando o valor atribuído à música que acompanha esta letra...A versionista, percebendo a função fundamental deste verso, optou por traduzi-­lo pelo verso So you say, mantendo a homofonia, elemento por ela eleito como aquele a ser privilegiado em sua versão.

domingo, 29 de setembro de 2019

ESCRITORES E SEUS GATOS #5


"Nós não tínhamos gatos, mas minha mãe dava de comer a gatos vadios que se juntavam ali na nossa grande varanda. Eu tinha relação muito próxima com esses bichos, comia com eles, dormia no chão em que eles se enroscavam. Eu pensava que era um deles. E por isso impus aos meus pais esse nome de “Mia” como celebração desses felinos. Olhando para trás eu acho que procedi bem porque baguncei essa fronteira de identidades que nos é tão cara e que traça um limite entre o humano e não humano. Eu amo os bichos por ser parte deles." Mia Couto

ESCRITORES E SEUS GATOS #4


“Os gatos oferecem para o escritor algo que os outros humanos não conseguem: companhia que não é exigente nem intrometida, que é tão tranquila e em constante transformação quanto um mar plácido que mal se move”.
Patricia Highsmith

sábado, 28 de setembro de 2019

ESCRITORES E SEUS GATOS #3


"Um gato tem honestidade emocional absoluta: os seres humanos, por uma razão ou outra, pode esconder os seus sentimentos, mas o gato não."
Ernest Hemingway 

ESCRITORES E SEUS GATOS #2


“Ele fixaria em Deus aquele olhar de esmeralda diluída, uma leve poeira de ouro no fundo. E não obedeceria porque gato não obedece. Às vezes,quando a ordem coincide com sua vontade, ele atende mas sem a instintiva humildade do cachorro, o gato não é humilde, traz viva a memória da liberdade sem coleira." Lygia Fagundes Telles

ESCRITORES E SEUS GATOS #1


“Tudo sei, a vida e o seu arquipélago,
 o mar e a cidade incalculável, 
a botânica 
o gineceu com os seus extravios, 
o pôr e o menos da matemática, 
os funis vulcânicos do mundo, 
a casca irreal do crocodilo, (…) 
mas não posso decifrar um gato”. 
Pablo Neruda

terça-feira, 27 de agosto de 2019

O APARTAMENTO DE NARA

(Foto de Arnaldo Agria Huss)

Se forem entrevistados 10 fãs de Bossa Nova e a eles for perguntado onde o gênero nasceu, 9 deles certamente responderão: no apartamento de Nara. Mas se a mesma pergunta for feita a Carlinhos Lyra ele logo responderá: "isso é conversa! Nem a Nara nasceu lá!"

O famoso endereço fica na Av. Atlântica, 2853, Ed. Louvre, apto. 303, onde Nara Leão residia com seus pais e a irmã Danuza. Ainda adolescente conheceu alguns colegas que curtiam um som e estavam em busca de uma batida diferente, mais alegre e leve do que os tristes samba-canções estilo "ninguém me ama, ninguém me quer" que tocavam no rádio. Foi assim que primeiro veio Roberto Menescal, Carlinhos Lyra e o lobo bobo Ronaldo Bôscoli. E depois só foi aumentando o número de "feras" que frequentavam o apartamento até o nascer do sol.


Naturalmente isso não iria durar para sempre. Uns foram se profissionalizando e a coisa tomou uma proporção que acabou rachando a Bossa Nova em direita e esquerda. Nara preferiu sair do castelo e subir o morro, estreando no espetáculo Opinião que a consagrou. Outros partiram pelo Galeão para NY e por lá ficaram ou voltaram em busca de uma carreira solo.


Mesmo que hajam outros lugares onde os primogênitos se reuniram e onde foram gestadas canções memoráveis, nenhum lugar concentrou tanta gente que fez história na música brasileira por metro quadrado. E é por isso que eu fico com a versão-lenda do famoso apartamento e com o legado do amor, do sorriso e da flor.

BECO DAS GARRAFAS


É impossível ler sobre Bossa Nova e não encontrar n citações sobre o Beco das Garrafas, uma pequena travessa sem saída onde germinaram notas fundamentais que deram o tom da música popular brasileira que ouvimos hoje.

Tantas histórias e causos estão reunidos no compêndio de Ruy Castro e na quase biografia de Nelson Motta, e chegam a parecer lendas. O que antes era feito por um sonho ou por sobrevivência deixou poucos registros indeléveis de uma arte genuína e com talentos inegáveis, num jeito de fazer e de viver de música muito primários se comparados aos que atualmente chegam ao mainstream de forma altamente financiada e sem qualidade.


Após ler tantos relatos não resisti e fui lá pisar naquele chão onde passaram muitos do que respeito, artisticamente falando. Desci na estação Cardeal Arcoverde, segui até o sinal, atravessei a rua e segui à esquerda mais duas ruas até entrar na Duvivier. À medida que ia avançando e avistando o mar fiquei pensando em como um lugar assim efervescente na madrugada, com muitos drinks e "garrafadas" sobreviveu em meio a prédios residenciais? Ainda incrédula perguntei a um vendedor de quinquilarias na rua: onde fica o Beco das Garrafas? Ele bem carioca respondeu: "Só mais uma esquina...onde tudo começou!". Atravessei a N.Sra. de Copacabana e finalmente cheguei lá. Para minha surpresa, a livraria Bossa Nova que ficava logo na esquina fechou. Segui adiante e lá estavam eles com seus letreiros imutáveis: o Little Club e o Bottle's Bar, renascidos após a iniciativa da Heineken em 2014. Vi alguns cartazes com as próximas programações: Quarteto do Rio (ex Os Cariocas) e Doris Monteiro. Tudo muito simples, quase artesanal, sem muito glamour nem apelo estético, condizente com o nível dos que frequentam o local por turismo ou por amor à arte.


Para completar o circuito, ao chegar em frente ao calcadão e virar à direita para retornar ao metrô, mais alguns passos e quem estava lá? Ele! O clássico símbolo de resistência dos anos dourados: o Copacabana Palace. Suspiros à parte, voltei para o hotel com a sensação de missão cumprida e certa de que ainda terei muito mais a explorar.






quarta-feira, 21 de agosto de 2019

RUA NASCIMENTO SILVA, 107


Após ler a biografia do Tom e o compêndio de Ruy Castro fiquei pensando: como foi
que eu morei no Rio tantos anos e não visitei certos lugares? Precisei sair de lá para conhecer tudo que deixei para trás por falta de acesso a fatos e causos da nossa música popular brasileira.

Lembro que a primeira vez que tive essa sensação de "Caramba! Quanta história tem nesse lugar!" foi quando avistei o Copacabana Palace. Aquela edificação imponente, clássica e símbolo de um Rio que não existe mais. Além dele, os livros relatam sempre as famosas boates da Zona Sul que também já se foram, onde muitos nomes hoje famosos tocavam madrugada a dentro para pagar o aluguel. E esmiuçando mais um pouco, tem o bar preferido, a mesa onde foi composta essa ou aquela canção...

No caso do Tom, há vários endereços entre o vai e vem do início do casamento com Thereza, mas sem dúvida alguma o mais lembrado é o da Rua Nascimento Silva, 107, Ipanema, Rio de Janeiro-RJ. Assim sua irmã Helena relata em Antonio Carlos Jobim, um homem iluminado:

"Mais uma vez, o perplexo Ângelo Fróla foi convocado com seu caminhão de mudanças. Rua Nascimento Silva, 107. Endereço que mais tarde seria famoso, cantado no samba de Toquinho e Vinicius, Carta a Tom. Um pequeno apartamento de duas salas e dois quartos, num prédio sem elevador. De suas janelas se via o morro do Corcovado, com a bela estátua do Cristo Redentor. Ainda não haviam construído à sua frente as grandes muralhas de concreto dos edifícios. Sentado ao piano, Tom gostava de ver o momento em que Ele se iluminava na hora do ângelus, os braços abertos abençoando a cidade do Rio de Janeiro."


Lá foram compostas com Newton Mendonça Meditação, Desafinado, Samba de uma nota só, entre outras, para não falar dos álbuns Canção do Amor Demais (Elizeth Cardoso), Chega de Saudade (João Gilberto) e as da peça Orfeu da Conceição (Vinícius de Moraes). Os registros feitos por Helena levam a concluir que o casal residiu lá de 1954 a 1962 (embora na placa conste 1960), quando sua mãe propôs uma troca de casa por causa do espaço maior para as crianças na Rua Barão da Torre, paralela à Nascimento Silva. De lá só saíram para a famosa casa navio da Rua Codajás, 108, Leblon, mas isso já é tema para outro post.








sexta-feira, 2 de agosto de 2019

GAROTA DE IPANEMA


Há mais de 50 anos, em 02 de agosto de 1962, o trio que mudou e lançou a música brasileira no mundo estreavam na boate Au Bon Gourmet no Rio, dando um certo prejuízo ao dono do espaço, o empresário Flávio Ramos, mas deixando um legado de canções inesquecíveis com a participação especial de Os Cariocas. Entre elas, está a história de uma certa garota que conquistaria para sempre o coração dos músicos e se tornaria nossa canção símbolo. Para sua estréia,  Tom, Vinicius, e João escreveram uma introdução especial. 

João Gilberto:

Tom e se você fizesse agora uma canção
Que possa nos dizer
Contar o que é o amor?
Tom Jobim:
Olha Joãozinho
Eu não saberia
Sem Vinicius pra fazer a poesia
Vinicius de Moraes:
Para essa canção
Se realizar
Quem dera o João
Para cantaaaaaaaaaaaaaar
João:
Ah, mas quem sou eu?
Eu sou mais vocês.
Melhor se nós cantássemos os três.
Os três:
Olha que coisa mais linda
mais cheia de graça
 […]

Historicamente, foi primeiro "grande encontro" da música brasileira, permanecendo 40 noites em cartaz, estando todos juntos pela primeira e pela última vez. Além de Garota de Ipanema, herdamos também os bônus que podem ser conferidos AQUI :
#1 a estréia de Samba do Avião, com Tom Jobim e Os Cariocas
#2 a estréia de Samba da Benção, com Vinícius
#3 a estréia de O Astronauta, com Vinícius (Tom faz o piano, Os Cariocas os vocais)
#4 Corcovado, com João Gilberto e Os Cariocas

segunda-feira, 29 de julho de 2019

MENOS É MAIS!


"Como inventamos uma sociedade de consumo consumista, compra-se e descarta-se. E o que estamos gastando é tempo de vida, porque quando eu compro algo ou tu, não pagamos com dinheiro, pagamos com o tempo de vida que tivemos que gastar para ter aquele dinheiro. Mas tem um detalhe: tudo se compra, menos a vida. 
A vida se gasta..."
(José Mujica - Documentário Vida Sóbria)

domingo, 14 de julho de 2019

NISE E OS BICHANOS


Ela dizia que os gatos são “excelentes companheiros de estudos, amam o silêncio e cultivam a concentração” e admirava a independência dos felinos, sempre ronronando ao seu redor no escritório. “Cultivo muito a independência. Por isso gosto do gato. Muita gente não gosta pela liberdade de que ele precisa para viver. No circo você vê tigre e urso, mas não vê um gato. O gato é altivo, e o ser humano não gosta de quem é altivo.”

(Nise da Silveira - Gatos, a emoção de lidar)

sábado, 6 de julho de 2019

R.I.P JOÃO GILBERTO


Hoje o Brasil perdeu um gênio que influenciou gerações de artistas com sua batida diferente, um baluarte da Bossa Nova que fez a música brasileira ganhar o mundo. Perfeccionista e cheio de manias, adorado por uns e aturado por outros, João Gilberto era de uma originalidade intransferível e impossível de ser plagiada. Chegava a cismar com alguns colegas do meio e tapava a posição do violão para não ser copiado.

Mesmo com sua timidez e posterior reclusão severa, todos os livros sobre Bossa Nova são escritos em torno do mito. Neles sempre há depoimentos de grandes nomes como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Chico Buarque, Marcos Valle, Gal Costa contando onde estavam e o que sentiram quando ouviram Chega de Saudade pela primeira vez. Talvez nem ele soubesse onde tão longe iria chegar e sem perceber foi imprimindo sua marca indelével nas canções que (re)gravou.

Ronaldo Bôscoli, que ele apelidou de Ronga, conviveu com o mestre e fez o seguinte relato em seu livro de memórias Eles e Eu:

"O que sempre impressionou todo mundo em João Gilberto foi sua inteligência e seu estilo. Eu diria que João tem um estilo de ser inteligente. As suas concepções, sua capacidade de criar um diálogo - João não fala palavrão e usa pouquíssima gíria -, o seu baianês, a sua capacidade de síntese, de explanação são impressionantes.

Num dia de carnaval, perguntei a João pela primeira e única vez:
- Afinal, João, de onde é que você tirou essa sua batida de violão?
- Deve ter sido quando eu era menino em Juazeiro. As lavadeiras levavam roupa no cesto para lavar no rio e desciam até lá com um suíngue danado. Eu tapava os ouvidos e só ouvia aquele negócio, squintim, squintim...A cadência sincopada das lavadeiras me inspirou esse ritmo da Bossa Nova. Acho que foi por aí...

É, deve ter sido, João..."



domingo, 30 de junho de 2019

PELAS RUAS DE SANTA TERESA...


"Veja o sol, é demais essa cidade! A gente vai ter um dia de calor." (Djavan)

Uma vila do Rio antigo sobre uma cidade: é assim a primeira impressão que se tem do bairro de Santa Teresa. O sossego das ruas, as casas suspensas em ladeiras sinuosas, artistas com obras instaladas a céu aberto nas calçadas ou em seus estúdios-casa. Tudo isso só é interrompido pela chegada e partida do bondinho com seus turistas ávidos de um cenário apropriado para fotografia e uma parada nos muitos barzinhos clássicos e de mesas disputadas. Além de perambular de um largo a outro, há quatro sugestões de programação clássicas para se aproveitar melhor o bairro em um dia ensolarado:

1-Passeio do bondinho: antes era cobrado uma passagem baratinha e a emoção já começava ao passar sobre os Arcos da Lapa, e ir aos poucos desvendando caminhos e paisagens. Infelizmente desde 2018 o passeio custa salgados R$20,00! Virou passeio pra turista, pois por 14,00 eu e mais três amigos chegamos facilmente de táxi partindo do Teatro Municipal. Pelo menos, os moradores cadastrados e estudantes da rede pública tem acesso gratuito.



2-Parque das Ruínas: de lá se tem belas vistas, incluindo o centro da cidade, a Baía de Guanabara e o Pão de Açúcar. Além de atividades culturais e da vista privilegiada, há um casarão restaurado que pertenceu à maior mecenas das artes da cidade, a cuiabana Laurinda Santos Lobo (1878-1946). O casarão do início do século passado já recebia saraus promovidos pela proprietária na época. Hoje a casa ganhou ares modernos com a adaptação de estruturas de vidro e ferro, um dos projetos premiados do arquiteto Ernani Freire. É aberto de terça a domingo das 10h às 18h, com entrada franca e agora tem uma lanchonete que trouxe mais segurança ao lugar. 




3-Museu Chácara do Céu: fui a primeira vez por recomendação de meu professor Filgueiras. Vem em seguida ao Parque das Ruínas e possui belos jardins (abertos diariamente das 9h às 17h) e vistas, além de um museu (aberto diariamente das 12h às 17h, exceto às terças-feiras) que abriga importantes obras de arte, sobretudo de artistas que estiveram no Brasil na primeira metade do século XIX. São quase 500 obras só do francês Debret, que fundou no Rio de Janeiro, uma academia de Artes e Ofícios, mais tarde Academia Imperial de Belas Artes. A casa do museu (bem como a casa do Museu do Açude, em outra área do Parque Nacional da Tijuca) foi uma das muitas residências do empresário, mecenas e colecionador de arte Raimundo Ottoni de Castro Maya (1894-1968), que entre outros feitos foi um dos fundadores do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Contemple as obras e vá para o jardim admirar o centro da cidade!




4-Bar do Mineiro: para o happy hour, volte para o Largo do Curvelo e siga em direção ao Largo dos Guimarães. Após uns 10 minutos de caminhada vemos o tal boteco carioca, famoso pela feijoada, pastéis e cachaças. Quadros com fotos de artistas consagrados brasileiros nas paredes, panelas e caldeirões de ferro e artesanato encontram-se por tudo quanto é lado. A única dificuldade é achar uma mesa no fim de semana, mas a experiência vale a pela.




Atenção: este post poderá sofrer atualizações a cada viagem.

CIDADE SUBMERSA


"Eu ia andando pela Avenida Copacabana e olhava distraída edifícios, nesga de mar, pessoas, sem pensar em nada. Ainda não percebera que na verdade não estava distraída, estava era de uma atenção sem esforço, estava sendo uma coisa muito rara: livre. Via tudo, e à toa. Pouco a pouco é que fui percebendo que estava percebendo as coisas. Minha liberdade então se intensificou um pouco mais, sem deixar de ser liberdade. Não era tour de propriétaire, nada daquilo era meu, nem eu queria. Mas parece-me que me sentia satisfeita com o que via." (Clarice Lispector)

sexta-feira, 14 de junho de 2019

NA TRANSVERSAL DO TEMPO


"Fechada dentro de um táxi
Numa transversal do tempo
Acho que o amor
É a ausência de engarrafamento
As coisas que eu sei de mim
Tentam vencer a distância
E é como se aguardassem feridas
Numa ambulância
As pobres coisas que eu sei
Podem morrer, mas espero
Como se houvesse um sinal
Sem sair do amarelo"
(João Bosco e Aldir Blanc)

sexta-feira, 31 de maio de 2019

FELICIDADE PELO CASAMENTO

"C’est une âme que son âme demande [...] qui s’attache à elle avec tant de force et qui souffre avec tant de bonheur son étreinte, querien ne puisse plus les

séparer..." (Jules Simon)








terça-feira, 28 de maio de 2019

É TÃO ESTRANHO, OS BONS MORREM JOVENS


De repente uma notícia triste, difícil e tudo muda. Um homem cheio de sonhos e com uma vida inteira pela frente, que morreu fazendo o que mais amava. Num momento assim não tem como a gente não refletir sobre a brevidade da vida, sobre como devemos deixar de lado coisas pequenas e insignificantes e amar no momento presente.

Descanse em paz, Linaldo Xavier...